sábado, 17 de novembro de 2018

UM TERERÉ COM GUIMARÃES ROSA, NO MEIO DO SERTÃO



— Grande Ser Tão Veredas, não?
— Todos somos... seres cheios de caminhos, de fantasias, de expectativas, de demônios em redemoinhos.
— Mas como enjaular esses demônios para que não causem o inferno na Terra?
— Rs!!! Já tentou enjaular um raio? E mais fácil montar e domar! Nossos demônios são cavalos selvagens, se domá-los, nos são úteis para o trabalho pesado. O homem não vive de santidade, vive na busca de deus, mas na hora do duelo é o diabo que puxa o gatilho da arma.
— Me parece uma visão de humano drástica para quem parece tão doce com a natureza.
— A natureza é bela, mas a beleza dela está justamente no fato de que tem seus atrapalhos, os raios incendeiam a mata seca, que arde no fogo de uma fênix, destruindo com o antigo, para trazer boas novas. O bicho homem tem modo de querer controlar a natureza, como filho mal criado querendo mandar na mãe, mas somos tão pequenos diante dela...
— Assim como filho mal educado, foi educado pela própria mãe, o ser humano só está aqui porque a natureza nos permitiu evoluir para o que somos.
— Essa é a grande benção, se chegamos onde estamos e aqui apeamos, podemos amontar e partir para novos caminhos, sermos seres melhores, essa é a beleza da vida, não estamos prontos, somos monte e desmonte, somos seres eternamente inacabados, fadados à mudança, mas abençoados por não sermos condenados a mesmice.
— Mas para seres de mudanças tão constantes, como ter a certeza do caminho?
— E quem disse que temos? O senhor veja, mire bem, não sabemos o que somos, não sabemos pr’onde vamos, nem donde viemos. Tudo que sabemos é que cá estamos e nessas constantes mudanças, temos que nos virar sem se avexar. Seguindo o rumo da vida e não da nossa vontade.
— Me parece montar em cavalo sem rédea!
— Talvez pior, é montar em cavalo que nunca foi selado.
— E como não cair?
— Talvez seja melhor o senhor perguntar como se levantar, o tombo já é certo, resta à incerteza do que fazer estando no chão.
— E quando o tombo é feio demais para levantar?
— Quando a onça pintada aparece, cavalo manco aprende a galopar em três patas. Nada como o aperto da vida, pra ensina a ter coragem, afinal, nada mais do que isso, de nos ela quer. A vida esquenta pra esfriar, sossega pra desinquietar, ela só quer que tenhamos coragem, coragem de amontar nesse cavalo, do qual sabemos que vamos cair, mas confiamos que vamos poder levantar.

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