— Você sabe que é tido por quase todos que te conheceram
como uma pessoa difícil de se relacionar, não é senhor Freud?
— Já parou para pensar que as pessoas chamam de “difícil de se
relacionar”, todos aqueles que não se submetem a elas? Se alguém é capaz de pensar
e toma suas próprias decisões, ao invés de seguir cegamente uma massa, ou se
submeter às vontades do outro, comumente será considerado alguém “difícil de se
relacionar”. Afinal, com quem é mais fácil de se relacionar, do que aquele que
se sujeita as nossas vontades? A questão é que somos castrados e isso nos
confere vontade própria, como sujeitos a parte do outro.
— É, mas você teve desentendimentos com quase todos que se
aproximaram de ti, estou inclusive pensando até que ponto levaremos essa
conversa, sem que você me cite em seu próximo livro, me chamando de místico
fraudulento ou algo do gênero.
— Primeiro senhor Wrobleski, que seu Ego é grande demais,
para se considerar relevante o suficiente a ponto de ser citado em uma obra
minha, isso não acontecerá. Segundo, que todas as pessoas com quem me indispus,
como sua referência ao senhor Jung, por exemplo, foram pessoas que colocaram a psicanálise
em risco. Para ele é fácil arriscar a credibilidade da psicanálise desse modo a
aproximando do misticismo, pois ele pouco investiu nela, além de estar em uma
posição social cômoda, sem preconceito antissemita, sem dificuldades
financeiras, sem sua moral sendo atacada a todo o momento, por pessoas que
fazem referência à suas obras, sem nuca as ter lido. Eu investi uma vida
inteira nesse projeto, a psicanálise é a forma mais eficiente de explicar a
condição e movimentação psíquica do ser humano e precisei de uma vida toda de
investimento libidinal, para organizá-la e conferir-lhe credibilidade científica,
não permitirei que alguém despreparado, faça uma coisa qualquer, sem nenhuma
pesquisa e experimentação clinica, e chame a isso de psicanálise, colocando a
baixo o mínimo de credibilidade que consegui para essa ciência do psiquismo
humano.
— Mas você mesmo deu essa possibilidade. Disse em suas obras
que a psicanálise não está pronta, que as pessoas podem desenvolvê-la,
modifica-la, fazer outros usos dela!
— Entenda senhor Wrobleski, quando você diz para seu
convidado que “sinta-se em casa”, você está afirmando que ele pode fazer bom
uso de sua casa, você espera que ele se sinta confortável, fique relaxado, se
alimente, banhe-se, talvez até durma em sua casa, mas não espera que ele ateie
fogo a residência, porque a casa é dele. Quando eu disse que as pessoas deveriam
desenvolver a psicanálise, me referia à exploração de casos clínicos, ao estudo
e analise teórica, com base científica, não que as pessoas poderiam pegar seus próprios
preconceitos e ideias imaginárias, sem nenhum fundamento teórico e chamar a
isso de psicanálise.
— Senhor Freud,... Já parou para pensar no que pode ser
feito da teoria no futuro, se em sua época, com você vivo e lúcido já estão a
desvirtuando desse modo? É melhor você tomar mais uma guampa de tereré para
refrescar o juízo, talvez nem tu, nem eu, sejamos capazes de imaginar o quão
longe as pessoas levarão as teorias, para que essas reafirmem preconceitos que
elas tinham muito antes de conhecer a teoria.
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