FREUD, Sigmund. Sobre o
Mecanismo Psíquico dos Fenômenos Histéricos: Uma Conferência. In: Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Imago. 1987.
Charcot
estuda o que os franceses chamam de “neurose maior” equivalente à histeria na
obra Freudiana. Através de Charcot foi possível compreender melhor a histeria traumática,
quando um paciente sofre um trauma psíquico ligado a uma parte de seu corpo.
Freud utiliza o exemplo de um trabalhador que sofre um acidente, no qual uma
madeira cai em seu ombro, ele vai para a casa sem nada grave, apenas com uma
pequena contusão, após um período que Freud denomina encubação, esse
trabalhador acorda com seu braço paralisado, sem saber o porquê, possivelmente,
sem nem mesmo se recordar do acidente ocorrido, aqui se estabelece uma histeria
traumática.
Freud nos
chama a atenção, para uma outra categoria de histeria, a que ele e Breuer
estudam a partir do caso Anna O e dos casos atendidos por Freud como Emmy Von
N, essa categoria Freud classifica como histeria comum, ou não traumática, se
referindo ao fato de nesses casos, não existir um evento físico causador do
sintoma. No caso do trabalhador citado por Freud, temos um trauma físico, o
impacto da madeira, no caso de Anna O e Emmy Von N, não existe esse
acontecimento físico, hoje entendemos como trauma psíquico, mas Freud se refere
a algo diretamente ligado ao corpo.
Freud toma,
por exemplo, situações de transtornos alimentares, citando uma paciente que
vivenciou situações de grande afeto nos momentos de alimentação, como ser
obrigada a sentar-se a mesa com pessoas que a desagradavam muito, assim como
vivenciar cenas asquerosas durante a alimentação, ou ser obrigada a comer algo
que desagradava de maneira significativa seu paladar, e posteriormente, sente
grande enjoo antes da alimentação, chegando a vomitar. Ele também faz uma referência
à anorexia, considerando que essa recusa em se alimentar, pode em muitos dos
casos, vir igualmente de situações vivenciadas durante a alimentação.
Freud faz
uma referência ao fato de um trauma dificilmente se referir apenas aquela
situação vivenciada, mas na maioria das vezes, ter uma ligação com cenas
anteriores mais primitivas. Ou seja, uma situação em si, não é traumática, mas
quando essa situação se liga a anteriores vivenciadas, forma-se o trauma, nesse
caso, trauma psíquico, não físico.
Por
exemplo, uma pessoa que tem seu carro fechado no trânsito, porém sem nenhum
tipo de sequela ou consequência física, ainda assim, desenvolve uma paralisia
de algum membro, possivelmente o quase acidente de carro, em si, não foi o
ponto inicial, mas apenas o desencadeador, o trauma já vinha se formando
através de um evento no qual um parente próximo cometeu suicídio utilizando o
carro, por exemplo, ou um acidente automobilístico sofrido pela mãe durante a
gravidez. Uma ligação mais primitiva, com eventos de grande carga afetiva.
Freud
também nos faz referência ao fato de os sintomas serem desencadeados por
situações nas quais a pessoa não expressou uma carga afetiva de desprezo,
repulsa ou nojo. Tomando por base o caso Anna O, a paciente desenvolveu um
transtorno alimentar relacionado à ingestão de água, após ver um cão bebendo água
de seu copo. Naquele momento, ela não conseguiu verbalizar a repulsa sentida, e
esse afeto não manifestado, se transforma no sintoma de ser incapaz de beber água.
Temos que
considerar, que quando Freud estuda a histeria, está imerso em uma cultura de grande
repressão, sexual e moral, apesar de em uma de suas obrar afirmar que para
algumas cidades, Viena era considerada liberal demais, o que me assombra. Mas
tomando por base essa repressão da época, principalmente uma repressão sobre as
mulheres, de como: deveriam se portar, da imoralidade de uma mulher ter desejos
sexuais, ou fantasias eróticas, diante dessa imensa repressão, temos sintomas
tão gritantes quanto a repressão se demonstrava. Nos dias atuais, não temos uma
repressão tão intensa, ainda existe sim, mas com menos força, o que faz com que
atualmente, os sintomas da histeria também sejam mais brandos, ainda
encontramos casos clássicos de paralisias, mas de maneira geral, temos muito
mais, doenças autoimunes, casos de transtornos alimentares, ou doenças
relacionadas ao estômago, enxaquecas sem casas neurológicas, desmaios em
situações de estresse, formas diferentes de se relacionar com o corpo, que em
suma, não se distanciam tanto da histeria clássica. A repressão, já não se faz
mais tão evidente, mas a cobrança social a substitui com eficiência, não se da
tanta ênfase ao que não se pode fazer, mas continua-se cobrando o que devemos
ser.
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